domingo, 30 de julho de 2023

São Pedro Crisólogo


    Foi um dos maiores pregadores da Igreja, amado tanto pelo povo como pela imperatriz romana e seus filhos, entre eles o futuro imperador Valentiniano III. Crisólogo significa 'palavra de ouro', dada sua facilidade de comunicar o Catecismo e conforto às almas que tiveram o privilégio de conhecê-lo. Escreveu 176 sermões, onde de modo simples explica os mais complicados assuntos da Doutrina da Igreja.
    Nasceu em Ímola, província de Ravena, Itália, em 380. Seus pais eram fervorosos católicos, e ainda jovem ele foi ordenado diácono. Esteve sob os cuidados de Cornélio, Bispo de Ímola, a quem chamava de 'pai'. Em 424, a imperatriz, que já o tinha como conselheiro pessoal, empenhou-se pessoalmente, embora não fosse necessário, para que ele fosse indicado ao cargo de Arcediácono de Ravena, que nesta época era a capital do Império Romano do Ocidente.
    Em 433, Valentiniano III também usou de sua influência para ele fosse indicado Arcebispo de Ravena, mas isso já era um clamor popular e ele acabou consagrado pessoalmente pelo Papa Sisto III. Pudera, ninguém menos que São Pedro havia aparecido em sonho ao Papa, exclusivamente para indicar São Pedro Crisólogo para o arcebispado.
    Eram difíceis tempos para a parte do Império Romano que ficava na Europa: godos, vândalos e hunos sitiavam cidades italianas, provocando grandes flagelos. E após três séculos de resistência e martírios para estabelecer-se contra as perseguições do próprio Império Romano, a Igreja via-se mais uma vez ameaçada. Não bastasse o perigo das guerras, impiedosos 'cristãos' atiravam-se à aventura das mais insanas teorias, burlando a Doutrina e desrespeitando a inspiração do Espírito Santo, que sempre se fez perceber tanto pela comunhão espiritual vivida pela Igreja como pelo voto da maioria nas decisões dos Concílios.
    Precisamente por esses anos, fantasiosos teólogos inventavam tresloucadas heresias a respeito da natureza de Jesus. O Primeiro Concílio de Éfeso, em 431, onde notavelmente brilhou a inspirada Sabedoria de São Cirilo, Patriarca de Alexandria, já havia aceito por ampla maioria que Jesus misteriosamente tinha duas naturezas: humana e divina. Acolhendo as manifestações de Deus exatamente como elas se deram, ao mesmo tempo que refutando grosseiras simplificações e reduções, o Concílio reconheceu que não havia mais iluminada conclusão para a compreensão do Cristo: Ele é totalmente Deus e, ao mesmo tempo, totalmente humano.


    Pouco tempo antes caíra por terra a heresia de Nestório, que dizia que as duas naturezas de Jesus só vagamente se relacionavam. Mas Eutiques, um alto sacerdote de Constantinopla, após vários acertos e acordos entre os bispos desta região, imprudentemente insurgiu com a heresia de que as duas naturezas de Jesus se haviam fundido numa só. E começou a divulgá-la, mesmo depois de ter recebido uma belíssima carta do Papa São Leão Magno, na qual magistralmente lhe explicou a Encarnação do Verbo. É de São Pedro Crisólogo a célebre frase: "Pedro fala por Leão", referindo-se a São Pedro Apóstolo e ao Papa Leão Magno. E de fato, as decisões do Concílio da Calcedônia, em 451, mais uma vez vão confirmar os entendimentos reconhecidos pelo Concílio de Éfeso de 431.
    Sabendo da inteligência e da importância de São Pedro Crisólogo para a Igreja, Eutiques escreveu-lhe uma carta, tentando convencê-lo de sua heresia. Recebeu, no entanto, uma inspirada resposta, a qual, se tivesse bom senso, teria acolhido e posto de lado suas malfadadas ideias. Escreveu-lhe o Prelado de Ravena: "Li tristemente tua triste carta, e percorri com grande aflição teus torturantes escritos. Porque, como a Paz das igrejas, a concórdia dos Sacerdotes e a tranquilidade do povo nos enchem de satisfação, duma alegria toda celeste, assim a divisão dos irmãos aflige-nos e deprime-nos, sobretudo quando com semelhantes causas... disputa-se temerariamente sobre a geração do Cristo, que a divina lei nos propôs como inexplicável. Tu não ignoras a que desvairamentos foi atirado Orígenes procurando os princípios, e Nestório disputando naturezas... Nós exortamo-te, honorável irmão, a que te submetas ao que foi escrito pelo bem-aventurado Papa de Roma: porque São Pedro, que vive e preside na Cátedra, dá a verdade de fé aos que a procuram. Quanto a nós, afeiçoados que somos pela paz e pela , não podemos interpretar as causas da fé sem o consentimento do Bispo de Roma."


    Seus ensinamentos sobre a piedosa vida valem não apenas para a humilde gente, a quem ele se dedicava na maior parte do tempo, mas certamente a todos que perderam as referências de uma vida verdadeiramente espiritual: "A oração é uma das três coisas que sustentam a fé. As outras duas são o jejum e a misericórdia. O que a oração pede, o jejum obtém e a misericórdia recebe. Unidos, a oração, o jejum e a misericórdia tudo podem. O jejum é a alma da oração, e a misericórdia a vida do jejum. Não os separeis jamais. Quem um não tiver, nenhum dos três terá; donde se segue que quem ora deve jejuar, e quem jejua deve exercer obras de misericórdia."
    Um dos mais ilustres bispos de seu tempo, São Germano de Auxerre, que havia percebido a vocação de Santa Genoveva e apadrinhado São Patrício, foi visitar-lhe em Ravena no ano de 448, para desfrutar um pouco de sua santidade. Mas aí deu-se outra vontade de Deus: carinhosamente acolhido por São Pedro Crisólogo, ele foi acometido de uma enfermidade e docemente morreu sob seus cuidados.
    Nosso Santo ensinava:

    "Quem não admira a grandeza de Maria, não sabe quanto Deus é grande."
    "O nome hebreu de Maria traduz-se por Domina, em Latim. O anjo dá-lhe, portanto, o título de Senhora."
    "O jejum é Paz do corpo, força dos espíritos e vigor das almas."
    "O jejum é o leme da vida humana, e governa todo navio do nosso corpo."
    "Ofereça tua alma a Deus, faça a Ele uma oblação com teu jejum para que tua alma seja uma pura oferenda, um sagrado sacrifício, uma viva vítima, permanecendo tua própria e ao mesmo tempo entregue a Deus. Quem deixar de dar isso a Deus, não será desculpado, pois só se te deres a Ele jamais estarás sem os meios de dar."
    "Vamos usar o jejum para compensar o que perdemos desprezando os outros. Vamos oferecer nossas almas em sacrifício por meio do jejum. Não há nada mais agradável que possamos oferecer a Deus, como o salmista disse em profecia: 'O sacrifício a Deus é um alquebrado espírito. Deus não despreza um ferido e humilhado coração.'"
    "Cada um de nós é chamado para ser, ao mesmo tempo, um sacrifício a Deus e ao Seu Sacerdote. Não perca o que a divina autoridade te oferece. Coloca a vestimenta da santidade, cinge-te com o cinturão da castidade. Deixa Cristo ser teu capacete, deixa a Cruz em tua testa ser tua infalível proteção. Teu peitoral deve ser o conhecimento de Deus, que Ele mesmo te deu. Continua queimando continuamente o doce incenso da oração. Toma a espada do Espírito. Deixa teu coração ser um altar. Então, com total confiança em Deus, apresenta teu corpo para o sacrifício. Deus não deseja a morte, mas a fé; Deus não tem sede de teu sangue, mas de teu sacrifício; Deus é aplacado não pela violenta morte, mas pela oferta de teu livre arbítrio."
    "Ele (Cristo) realmente fez de Seu Corpo um vivo sacrifício, porque, apesar de morto, Ele continua a viver. Em tal Vítima, a morte recebe seu resgate, mas a Vítima continua viva. A própria morte sofre o castigo. É por isso que a morte dos mártires é, na verdade, um nascimento, e seu fim, um começo. Sua execução é a porta para a Vida, e aqueles, de quem se pensou terem sido apagados da terra, brilhantemente reluzem no Céu."
    "A mão do pobre é o gazofilácio (local das ofertas) de Cristo, porque tudo que o pobre recebe é Cristo que o recebe."
    "Os pobres estendem a mão, mas é Deus Quem recebe o que é oferecido."
    "Os que passaram, viveram para nós; nós, para os vindouros, e ninguém para si."
    "Quem, ao pedir, deseja ser atendido, atenda quem a ele se dirige. Quem quer encontrar aberto, em seu benefício, o coração de Deus, não feche o seu a quem o suplica."
    "Os Magos estão admirados diante do que vêem: o Céu sobre a terra e a terra no Céu; o homem em Deus e Deus no homem. Vêem contido num Pequenino Corpo Quem não pode ser contido por todo o mundo."
    "Ele é o Pão semeado na Virgem, fermentado na carne, moldado em Sua Paixão, assado na fornalha do sepulcro, colocado nas igrejas e posto sobre os altares, que diariamente fornece o Celestial Alimento aos fiéis."
    "Pois aquele que indignamente toca o Corpo de Cristo, recebe sua condenação."
    "Hoje Cristo opera o primeiro de Seus sinais do Céu, transformando água em vinho. Mas a água (misturada com o vinho) ainda precisa ser transformada no Sacramento de Seu Sangue, para que Cristo possa oferecer bebida espiritual do cálice de Seu Corpo, para cumprir a profecia do salmista: 'Quão excelente é Meu Cálice, aquecendo Meu Espírito.'"
    "E o Criador… fez-te à Sua imagem para que tu, em tua pessoa, pudeste tornar o invisível Criador presente na terra. Ele fez de ti Seu legado, para que o vasto império do mundo pudesse ter o representante do Senhor."
    "Agora que renascemos, ... à semelhança de Nosso Senhor, e, de fato, fomos adotados por Deus como Seus filhos, nesta imagem vamos colocar por completo Nosso Criador, de modo a ser inteiramente como Ele, não na Glória que só Ele possui, mas na inocência, simplicidade, gentileza, paciência, humildade, misericórdia, harmonia... aquelas qualidades nas quais Ele escolheu tornar-Se, e ser Um conosco."
    "Ouça o apelo do Senhor: '... Vem, então, volta-te a Mim e aprende a conhecer-Me como Teu Pai, que paga o bem pelo mal, o amor pelo ferimento, e a ilimitada caridade por perfuradas chagas.'"
    "Deus prefere ser amado que ser temido."
    "Qualquer um que deseje brincar com o diabo, não pode alegrar-se com Cristo."

    O Sermão 30 é uma de suas mais conhecidas obras:

    "'Ele come com publicanos e pecadores!'
    Deus é acusado de vergar-Se ao homem, de sentar-Se perto do pecador, de ter fome de sua conversão e sede de seu regresso, de tomar o alimento da misericórdia e o cálice da benevolência.
    Mas Cristo, meus irmãos, veio a esta refeição; a Vida veio ao seio de seus convidados para que, condenados à morte, vivam com a Vida; a Ressurreição prostrou-se para que aqueles que jaziam se levantem de seus túmulos; a Bondade baixou-se para elevar os pecadores até ao perdão; Deus veio ao homem para que o homem chegue até Deus; o Juiz veio à refeição dos culpados para desviar a humanidade da sentença de condenação; o Médico veio aos doentes para restabelecê-los comendo com eles; o Bom Pastor inclinou o ombro para trazer a ovelha perdida ao aprisco da Salvação.
    'Ele come com publicanos e pecadores!'
    Mas quem é pecador, senão aquele que recusa ver-se como tal? Não será afundar-se em seu pecado e, a bem dizer, identificar-se com ele, o deixar de reconhecer-se pecador? E quem é injusto, senão aquele que se acha justo?…
    Vamos, fariseu, confessa teu pecado, e poderás vir à mesa de Cristo; Cristo, por ti, far-Se-á Pão, esse Pão que será partido para o perdão de teus pecados; Cristo tornar-Se-á, por ti, no cálice, esse cálice que será derramado para a remissão de tuas faltas.
    Vamos, fariseu, compartilha da refeição dos pecadores, e Cristo compartilhará de tua refeição; reconhece-te pecador, e Cristo comerá contigo; entra com os pecadores no festim do Teu Senhor, e poderás deixar de ser pecador; entra com o perdão de Cristo na casa da misericórdia."

    É do trabalho de São Pedro Crisólogo a construção do Mosteiro de Classe, uma pequena cidade próxima à sua diocese. Em Ravena, propriamente, ele construiu uma igreja em homenagem a Santo André e outra a São Pedro, a quem tinha como padrinho.
    Em 451, sentindo que chegava sua hora, pediu dispensa do bispado e retornou a Ímola, onde havia iniciado sua vida sacerdotal. No dia seguinte á sua chegada, rezou a Santa Missa pela manhã na igreja de São Cassiano, e aos fiéis pediu para ali ser enterrado, perto do altar. Ao meio-dia, serenamente faleceu.
    São Pedro Crisólogo foi reconhecido como Doutor da Igreja.


    São Pedro Crisólogo, rogai por nós!